"Ser poeta não é ambição minha
É a minha maneira de estar sozinho"
(Alberto Caeiro)

sexta-feira, 18 de março de 2011

Espetáculo a dois

"Ah! DinDi, se soubesses do bem que eu te quero,
O mundo seria, DinDi,
Lindo (...)
Por você, DinDi, 
Que é a coisa mais linda que existe (...)"
Tom Jobim


Dois bailarinos que se entretiam no palco
Sem pressa, sem hora,
As vezes sem música, sem luz,
Sempre sem vontade de ir embora


Noite adentro ela dançava
Passos de tirar o fôlego
Mas ele não se cansava
Prendia nela os olhos
Neles achava o ânimo e inspiração
Dois espelhos onde ele via solidão


Pelas mãos dele o corpo dela
Girou, flutuou no ar
Fez-se em movimento e beleza
Mas era o coração dela
Que ele se esforçava por alcançar
E que lhe escapava em terna sutileza


Dançavam a oportunidade única
No deleite daquele sorrir
Ensaiaram e cantaram Chico:
Me diz agora como ei de partir


Ele quis no corpo dela
Escrever poesia
Ele quis se saciar daquele perfurme
Que exalava e dançava junto com a melodia


Mas quando tudo acabou
Não havia mais justificativa
Para tocá-la
O mundo quase desmoronou
Tentou tocar a música, ligar as luzes,
Em passos provocá-la
Tudo era silêncio e tudo parou


Que pena que não havia platéia
É certo que de pé o mundo aplaudiria
Um bis eterno haveria
E o espetáculo poderia continuar


Ítalo 16/03/11

quinta-feira, 3 de março de 2011

Caminhada

Não sabia ao certo o que fazer, mesmo que dentro de mim gritasse uma vontade louca de chegar a algum lugar e fazer repouso dessas vontades absurdas que andam me levando pra lá e pra cá. Não poderia estar certo da validade de fazer-me andarilho errante, mas cada passo dado era um pouco mais longe e isso talvez fosse o suficiente. No céu a indecisão da chuva não deixava o dia acabar e não deixava a noite acontecer.  Cansado deixei que gotas brincassem nas lentes dos óculos que há muito já não interferem muito no meu jeito de ver o mundo.

Na minha mente os pensamentos pulavam, querendo ou não, estava levando os desejos em mim enclausurados pra passear. Pensei que talvez fosse hora de desistir dos versos e começar a escrever em prosa. Pensei que talvez fosse tempo de desistir do jazz, do Miles, do Coltrane, e arriscar uma invenção ou outra de Bach. Pensei que já estava crescido demais pra prender-me em porquês e que já passava a hora de concentrar-me nas respostas. A caminhada era prazerosa e do alto de um viaduto vi a cidade ao longe se acender, e lá trás os subúrbios escondiam o que estava além. Reticências dão lugar a imaginação e não foi diferente comigo. Pensei como seria bom se tudo que se anseia tivesse a distância de uma boa caminhada. As velhas figuras ilustravam o caminho, vez ou outra tinham até mesmo o poder de apressar o meu passo, e tornavam ainda mais pitoresca a minha contemplação poética, reduziam ao ridículo minhas aspirações de algo mais.

Procurei em vão pensar um motivo que me mantivesse caminhando, que me levasse pra bem longe, e, se houvesse chegada, eu pudesse por fim ser surpreendido. Depois de tanto caminhar e tanto pensar, distraído, esbarrei comigo mesmo, mas me esqueci de perguntar pra onde estava indo.


Ítalo 03/03/11

terça-feira, 1 de março de 2011

Sem palavras

Fiquei sem o que dizer
Quando das palavras me roubou
A inciativa
Quando desse seu revelar que em tudo
Me cativa


E rabiscar não pude se minhas mãos
Agarravam o momento
Nem as letras das velhas canções
Sobraram no pensamento


Sem palavras, sem versos
Sem o que dizer
Nem um discurso ensaiado
Já que não pude prever


Mas nesse silêncio
Me deixou tão só
Teus sinais tão confusos
Sem ser melhor, nem pior


Hoje não quer me ouvir
E foi embora
Tão justo e plausível
Só calado permaneço agora


Não sei quando voltarei a ter
As palavras que levou contigo
Se for longo o tempo
Talvez delas não vou querer
Quem sabe trarei novas comigo


Ítalo 01/03/10